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APEL-013/2017

Rio de Janeiro, 21 de setembro de 2017

Ilmo. Senhor
Fábio Henrique de Souza Coelho
Superintendente da Superintendência Nacional
de Previdência Complementar - Previc
Edf. Venâncio , 3000 SCN Quadra 6
Conj.A-3ºandar
Brasília-DF

C/c
Annete Lopes Pinto
Chefe do Escritório de Representação
Do Rio de Janeiro –Previc
Av.Presidente Vargas, 730- 16º andar
Torres 1 e 2
Rio de Janeiro-RJ

Permita-nos, em nome da Associação dos Participantes Aposentados da ELETROS – APEL, apresentar algumas considerações sobre interpretação do Artigo 61 do Regulamento do Plano BD ELETROBRÁS, administrado pela Fundação ELETROS.

I – Considerações preliminares

 

O procedimento de migração dos participantes da Fundação ELETROS, do Plano BD ELETROBRÁS para o Plano CD ELETROBRÁS (com a cisão das reservas atuariais do primeiro, lá nos idos de 2006) suscitou muitas e consideráveis dúvidas entre todos os assistidos que permaneceram no Plano BD e, também, junto aos profissionais que estavam à frente do assunto, naquela oportunidade.

Uma das grandes razões levantadas, na ocasião, como fator de impedimento à implementação de tal metodologia, além, logicamente, de algumas impossibilidades legais suscitadas com a edição das Leis Complementares 108 e 109 de 2001, foi a evidente quebra do princípio do coletivo que deixava de lado a questão da solidariedade entre os participantes (razão fundamental para a manutenção do equilíbrio atuarial do Plano BD).

A governança da Associação dos Aposentados Participantes da ELETROS - APEL debateu muito sobre o assunto (com ELETROBRAS, ELETROS, Conselheiros, advogados, etc.), pois entendia que para passar a existir dois Planos (BD e CD), necessário seria ocorrer cisão de Ativos garantidores e reservas do Plano BD (um desfavor aos que ficaram impedidos de migrar para o novo Plano). Isto mesmo: impedidos de migrar, afrontando, assim, o tão proclamado princípio Constitucional da solidariedade entre os participantes.

A ELETROBRAS insistiu, pois era do seu desejo e total interesse implantar o novo Plano e fazer migrar para lá o máximo de participantes (somente os participantes ativos de seu quadro de pessoal), mas faltava-lhe convencer aos órgãos reguladores e fiscalizadores de que isso era possível, embora que, para a prática da migração naquela oportunidade, entendia-se que existia um obstáculo a ser superado, isto é, o § 1°do Art. 14 da LC 109/2001 (“não será admitida a portabilidade na inexistência de cessação do vínculo empregatício do participante com o patrocinador”).

Ainda que portabilidade signifique transferência,  daí a nosso ver, a proibição contida na LC 109/2001,   a posição defendida pela PREVIC, à época,  era de que “a simples mudança de um plano para outro conhecida como migração de plano, sem o rompimento do vínculo empregatício com o patrocinador, no interior de uma mesma entidade de previdência, não constituía portabilidade, mas apenas uma novação de contrato”. (Adacir Reis, Fundos de Pensão em Debate, Brasília Jurídica, 2002, pag. 22).

Na prática, era isso que defendia a ELETROBRAS, pois eram os seus então empregados ativos (participantes da ELETROS) que estavam sendo convidados a participar da migração para o novo Plano CD.

Discutiu-se à exaustão sobre qual seria a metodologia para a cisão dos ativos garantidores do Plano BD, igualmente sobre a questão da limitação regulamentar quanto ao salário real de contribuição, um impedimento à migração como previsto no Regulamento do Plano BD e qual seria a modalidade de recursos das patrocinadoras para permitir a migração dos empregados que estivessem atingidos por tal limitação.

 

II – Postura da APEL ante as circunstâncias

- A APEL tanto participou das tratativas como resistiu energicamente em defesa dos assistidos e pensionistas (participantes do seu quadro de associados). Os entendimentos (considerando aí reuniões, as mais variadas, as discussões técnicas, busca de apoio jurídico, etc.) levaram seguramente uns cinco anos (detalhe: as LC 108 e 109 são de 2001), com o assunto aprovado em 2006.

A APEL resistiu o mais que pode, buscando entender os fundamentos e as defesas da ELETROBRAS quanto às questões: (i) metodologia pretendida por ela para a cisão dos ativos garantidores do Plano BD, (ii) modalidade de aporte das patrocinadoras para fazer frente ao desbloqueio do teto, como inscrito no Art. 15 §§ 4º e 5º  do Regulamento do Plano BD e (iii) por que não permitir a adesão dos assistidos pela ELETROS (?).

Toda a resistência da APEL foi vencida quanto a tais questões, em razão do aprovado na 46? reunião do Conselho Deliberativo da ELETROS (2005) e pela SPC, conforme Ofícios SPC/DETEC/CGAT 1710, de 03.11.2005 e SPC/DETEC/CGAT 1004, DE 29.03.2006 (este reconheceu, após a edição do Ofício anterior, a sua eficácia).

Com o Art. 61 do Plano BD revisado e aprovado por toda uma sequência de órgãos oficiais e capacitados para aprovarem ou deixarem de aprovar tais medidas (ELETROBRAS – Diretoria, Conselho de Administração, Assembleia Geral, Auditores; ELETROS – Conselho Deliberativo; SPC- DETEC/CGAT, Ministério do Planejamento, Ministério de Minas e Energia, PREVIC etc.) o Plano CD/ELETROBRÁS foi aprovado, conforme defendido pela Patrocinadora ELETROBRÁS.  O tão discutido Art. 61 do Plano BD foi, assim, uma medida compensatória definida pela ELETROBRÁS, com toda a certeza de propósito, para aqueles que foram IMPEDIDOS de migrar para o novo plano (os aposentados e pensionistas). Saliente-se aqui, mais uma vez, que o instituto Constitucional da solidariedade entre os participantes, está sendo posto à prova.

É lícito repassar neste ponto, o regime complementar que atendia (e ainda atende) aos participantes da ELETROS, como segue:

1) - um Plano BD  ancora o seu equilíbrio atuarial no coletivo, observando a total solidariedade entre os participantes, o que privilegia o conceito de previdência calcado no direito ao benefício respaldado em um patrimônio coletivo, que deve ter como destinação o pagamento dos benefícios oferecidos, desde que observadas as condições inicialmente (contratuais) previstas. Portanto, a solidariedade é princípio jurídico e instrumental técnico, essência e razão de ser da previdência complementar no regime de benefício definido (BD). Toda e qualquer utilização que viesse a ser dada ao patrimônio do plano BD haveria de observar (resguardar, proteger) tais fundamentos; e

2) – Saliente-se que a relação jurídica que se desenvolveu entre a ELETROS e os participantes do Plano BD é CONTRATUAL (atente-se para o Art. 422 do Código Civil), volitiva, de natureza privada, civil-previdenciária, tendo se aperfeiçoado quando da adesão dos participantes ao Plano e a sua aceitação pela ELETROS formando, como é de se entender, o ato jurídico perfeito.

Realce-se aqui (por ter sido um dos pontos muito considerado nas discussões que se desenvolveram) que quando se quebra qualquer dos princípios apontados, os quais patrocinaram a formação desse ato jurídico perfeito, se está afrontando as garantias fundamentais dos assistidos, como alude o Art. 5°, inciso XXXVI, da Constituição da República Federativa do Brasil, que estabelece: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada” (ATENÇÃO: 11 anos após a sua total aceitação por todos os órgãos oficiais/competentes e governanças envolvidas, o assunto é retomado em prejuízo dos assistidos e pensionistas, como se a eles coubessem as responsabilidades fundamentais que promoveram a implementação das regras que orientaram os seus sustentos a partir desse conjunto de medidas).

Como defendem os advogados, um ato jurídico perfeito, coberto pelo manto protetor da Constituição Federal, requer, para sua alteração, o consentimento das partes. No caso da migração pensada, defendida e executada pela ELETROBRAS, grife-se, somente uma parcela dos participantes do Plano BD aquiesceu a tal propósito, não caracterizando, por conseguinte, o consentimento do universo de participantes do referido plano, haja vista que os assistidos e pensionistas ficaram de fora, impedidos como já referido anteriormente, de se manifestarem (foram ignorados no processo de migração). A migração, ao que se entende, não redunda em prejuízos para quem sai do Plano, mas para os que nele permanecem (tendo as reservas de seus planos seccionadas, fatiadas).

 

III – Parece que a verdade dos fatos foi esquecida

- Em andamento está o estudo aprovado pelo Conselho de Administração da ELETROBRAS, encaminhado à ELETROS, o qual visa a sustentabilidade e viabilidade do Plano BD (assunto estudado pela Mercer, na parte atuarial/financeira e Bocater, na esfera jurídica). Segundo essas avaliações, para o equilíbrio e viabilização do Plano BD serão necessárias as seguintes ações: “migração para um novo plano de contribuição definida; revisão do custo normal dos assistidos com a nova metodologia e [alteração] de regulamento e retirada de patrocínio com as reservas remanescentes”.

Nesse meio tempo, o Plano BD veio apresentando resultados deficitários, o que provocou o entendimento com a Patrocinadora ELETROBRAS para o seu equacionamento, através de um Termo de Compromisso, tendo o mesmo sido encaminhado à Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais – SEST, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que concluiu que não poderia se manifestar, sobrestando a eficácia de  tal Compromisso, até que fosse esclarecida pela Procuradoria Jurídica da PREVIC a controvérsia derivada das regras dispostas no §2° do art. 61 do Regulamento do Plano BD/ELETROBRAS e nos art. 44 e 45 do Regulamento do Plano CD/ELETROBRAS.

Com relação à redação do art. 61 do Regulamento do Plano BD/ELETROBRÁS, deve-se observar, para o seu entendimento,   a disposição normativa prevista na Lei Complementar 95, de 26.02.1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona. De acordo com o seu art. 11, as disposições normativas devem ser redigidas por clareza, precisão e ordem lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas:...

III – para a obtenção da ordem lógica:...

c) expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida;
...
Assim, o § 2º do art. 61 expressa uma exceção à regra prevista no caput do artigo e não se confunde com o disposto no § 1º.  Protege o direito dos  aposentados e pensionistas que permaneceram compulsoriamente no Plano BD e estão amparados pelo preceito constitucional do ato jurídico perfeito.  Saliente-se que, na ciência atuarial, a saída de numerário que não naquelas modalidades previstas no contrato implica, necessariamente, desequilíbrio para o plano, o que significa maior carga para os que ficam no plano.

Detalhe: A ELETROBRAS ao proceder dessa forma não deu atenção aos interesses dos assistidos (aposentados e pensionistas), não os consultou e resolveu desse jeito, ajustou como pode a situação junto a SPC (atual PREVIC), demais autoridades e desceu “ goela abaixo” dos assistidos a cisão de suas reservas matemáticas, além de não lhes permitir, como anteriormente comentado, a migração para o novo Plano (CD). Entendemos que foi um ato de  violência contra eles. Já os que puderam migrar (empregados ativos) tiveram benefícios extraordinários: liberados quanto ao desbloqueio do teto previsto no Art. 15 do Regulamento do Plano BD e quanto aos déficits futuros que viessem a recair sobre as suas reservas saldadas transferidas para o novo Plano.

IV – Onze anos após proclamado o Ato Jurídico Perfeito

Pois bem, a Procuradoria Jurídica da PREVIC se pronunciou e seu Parecer n° 42/2017/CGRJ/PF-PREVIC/PGF/AGU culmina com uma apresentação radical que conclui, onze anos depois de implantado o Plano CD/ELETROBRAS (apoiado por todos os carimbos, despachos, pareceres e atos de  autoridades constituídas, em especial da SPC [atual PREVIC]):

- “45. Ante todo o acima exposto e com a reiteração expressa, ainda mais uma vez, das conclusões do Parecer n. 119/2012/PF-PREVIC/PGF/AGU, diante da constatação de direta afronta à Constituição e legislação infraconstitucional a cláusulas do regulamento concluímos que: (1) não se aplica o conceito de “contribuições extraordinárias” fixado no art. 19 da L.C. n. 109/01, segundo teses originalmente adotadas no âmbito jurídico desde o Parecer n. 02/2005/DEJUR/SPC; (2) não se pode admitir a assunção de déficits, serviço passado e outras finalidades, como despesas administrativas, ainda que referentes a obrigações anteriormente firmadas e independentemente da data de vinculação dos participantes ao plano de benefícios ou ao fato de já estarem aposentados, diante dos disposto nos arts. 202, § 3°, da Constituição e 5° e 6° do corpo da E.C. n. 20/98, pois tem eficácia obrigatória o limite de paridade constitucional a partir de 16/12/2000, devendo eventuais ajustes atuariais do Plano a seus ativos já terem sido feitos no mesmo prazo de dois anos fixado constitucionalmente; (3) a previsão de cláusula regulamentar determinantes de assunção exclusiva de déficits por patrocinador governamental ofende diretamente não apenas os dispositivos constitucionais indicados, como também a L.C. n. 108/01 e a Resolução CGPC n. 26, de 29/09/2008; (4 ) embora se trate de Órgãos autônomos e independentes, o entendimento presente coincide com o do Plenário do TCU (ACÓRDÃO n. 1922/2016); (5) não podem ser convalidadas cláusulas de Regulamentos de Planos de Benefícios que contenham regras desrespeitantes à paridade constitucional, devendo ser afastadas, por consequência, consoante entendimento já consolidado nesta Procuradoria (Parecer n. 119/2012/PF-PREVIC/PGF/AGU,  aqui integralmente aplicável), as alegações de ato jurídico perfeito, direitos adquiridos ou coisa julgada, bem como decadência   46. É o parecer, sub censura. São Paulo, 05 de julho de 2017.  DANIEL PULINO/Procurador Federal/PF/PREVIC”.

V – Nossas conclusões

Por tudo que vivemos lá entre os idos de 2001 e 2006 (implantação das L.C. 108 e 109 e edição do Plano CD/ELETROBRAS) a respeito dos ajustes necessários de enquadramento das regras das EFPP ao novo regime e, ao mesmo tempo, a desejada implantação do Plano CD/ELETROBRAS que vingou (após périplo de cinco anos de vais e vens das discussões da patrocinadora com as governanças, atuários, consultores jurídicos e órgãos oficiais do governo federal), independente de estar de acordo com o assunto, a representação dos assistidos (APEL), uma vez que foi oferecida, pela ELETROBRAS, com a anuência dos órgãos federais, a garantia expressa no já citado Art. 61 do Regulamento,  permitimo-nos dizer:

  1. Foi e está sendo difícil para esta representação concordar com a forma como o assunto - de tamanha sensibilidade (envolvendo um considerável contingente de idosos com idade média de + 74 anos) - está sendo tratado sem qualquer participação da representação dos interessados, os quais poderão ser brutalmente atingidos;
  2. Perturba-nos a simplicidade com que se está tratando um assunto que envolve patrimônio financeiro já consolidado (há 11 anos), de pessoas que não tiveram outra participação no artigo 61 do Plano BD, senão a de serem seus titulares históricos;
  3. A responsabilidade fundamental sobre todos os procedimentos que culminaram com a edição do referido artigo 61 deve ser atribuída às Patrocinadoras, suas governanças, SPC (atual PREVIC), o então DEST (atualmente SEST) do Ministério do Planejamento e demais envolvidos nos estudos e conclusões que ensejaram tal alteração de plano de benefícios da ELETROS. Não entendemos que o peso dessa responsabilidade e seu total ônus histórico devam ser de responsabilidade dos assistidos do Plano BD amparados pelo Art. 61;
  4. Reduzir atualmente os ganhos fundamentais à alimentação, saúde, teto, lazer, etc. desses idosos - que não têm a mínima condição de acesso ao mercado de trabalho - é condená-los a uma situação de pânico, a qual, a essa altura de suas vidas (muitos já com problemas crônicos de saúde), não deveriam estar sendo submetidos, podendo vir a acarretar a extinção do Plano de Saúde gerido pela ELETROS e custeado 100% (cem por cento) pelos assistidos;
  5. Notamos um total desprezo da parte do estudioso Procurador por todas as tratativas e acordos oficializados entre as partes que interagiram na elaboração do Regulamento do Plano BD do que resultou a inclusão do art. 61;
  6. O ilustre Procurador que está patrocinando esse entendimento, com tardia mostra de conhecimentos sobre a Carta Magna e sobre todo o composto de leis  infraconstitucionais, desculpe-nos afirmar, intempestivamente, onze anos depois de o assunto ter sido proclamado - ato jurídico perfeito por quem de direito naqueles tempos idos, o que, sem sombra de dúvida, levará muitos idosos ao total desespero, pânico e, alguns, certamente à morte. Desta forma e com tal entendimento, está reduzindo a escombros: estudos técnicos, pareceres técnicos, argumentações, interpretações, despachos de órgão oficiais e aprovações  dos quais originou o, por ele rejeitado, artigo 61 do Regulamento do Plano BD em vigor;
  7. Será que o que ele considera não possuírem os assistidos, i.e, seus direitos baseados (previstos) num ato jurídico perfeito, terão que ser invocados pelas vias judiciais, implicando em problemas para a Fundação, Patrocinadoras e a própria PREVIC, que sendo o órgão regulador e fiscalizador, tem o dever de, em nome do Estado, “... proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios”(Art. 3º item VI da LC 109)?

Era o que tínhamos a comentar, esperando que todos os órgãos oficiais envolvidos busquem uma solução que contemple, de forma serena e transigente, àqueles que tanto lutaram pelos seus direitos e deles desfrutaram, sempre com a chancela das autoridades competentes.

Atenciosamente,

Eduardo Eugênio Figueira                               Jack Nottingham Steiner
Presid. C. Deliberativo                               Presidente