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A Eletrobras e as artificialidades jurídicas

Por Jorge Rodrigo Araújo Messias

e Alexandre Silveira*

03/06/2023 

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.385, proposta pela Advocacia-Geral da União na Suprema Corte, em 5 de maio, contra dispositivos da lei 14.182/2021 (Lei de Desestatização da Eletrobras), desencadeou uma série de críticas por parte de vozes do mercado. Uma das mais recorrentes é que a iniciativa pretende minar o sistema de Corporation, que veda a constituição de blocos de controle definidos e impede que acionistas detenham participação com direito a voto maior que 10% do capital da companhia.

Os mesmos críticos argumentam que os investidores adquiriram parte do capital social da Eletrobras com a perspectiva de que não haveria nenhuma interferência da União na condução da empresa, fato que se refletiria nas ações adquiridas nas ofertas públicas.

Tais argumentos, em nossa avaliação, são falaciosos. Isso porque, antes de tudo, não se pode garantir que o preço pago pelos compradores das ações incluía valor adicional relativo ao controle da empresa. Diferentemente de um leilão tradicional, em que há oferta global de ações com a aquisição de controle, não há possibilidade de estabelecer uma correlação entre os preços praticados e a cessão do controle da empresa. Exatamente por isso, há quem sustente que o valor privado investido na empresa, com redução do poder de voto da União e sua consequente partilha entre minoritários, deveria suplantar a cifra de R$ 280 bilhões.

No entanto, para demonstrar que não existe relação necessária entre preço e diluição do poder de voto da União, basta lembrar que todos os investidores que detinham ações da empresa antes da desestatização foram premiados, sem nenhum investimento adicional, com maior participação política nas deliberações mediante o embargo artificialmente criado ao exercício do poder político pela União.

Todos os acionistas tinham participação inferior a 10%. Todos, então, foram favorecidos. Com a procedência da demanda judicial, a diminuição da participação da União nas deliberações da companhia, por sua vez, ficará assegurada quando houver a efetiva diluição do capital por ela detido mediante novas ofertas de ações.

Sob outra ótica, não há na ação proposta nenhuma crítica ao modelo de Corporation. Em verdade, a insurgência da União é contra a aplicação de tal modelo sem que se tenha a efetiva diluição do capital social da empresa. Não por outra razão, as analogias com outras companhias, a exemplo de B3 e Embraer, não se sustentam.

O maior acionista da B3 detém apenas 10,6% do capital. Na Embraer, 15,1%. As ações ordinárias diluídas em mercado superam 72% na B3 e beiram 80% na Embraer. Tais companhias têm real diluição do capital social, e não uma artificialidade jurídica concedida a minoritários sem o correlato pagamento pelo poder político retirado da União.

O processo de desestatização da Eletrobras está incompleto. A aplicabilidade imediata das previsões legais de corporação importa, sim, num capitalismo sem risco, em que minoritários com posições relevantes administram a empresa.

Porém, na hipótese de fracasso dos negócios, o prejuízo da União será, no mínimo, proporcional ao capital público investido na empresa. Tudo sem afastar a responsabilização por eventual descontinuidade no serviço público essencial por ela prestado.

Daí a legítima pretensão veiculada na ADI: uma interpretação da legislação mais ajustada à finalidade de real desestatização da empresa, mediante a diluição dos recursos públicos hoje nela investidos. Somente assim serão afastadas compreensões que impliquem possibilidade de dirigir a companhia sem correspondente responsabilidade por suas atividades.

Nas atuais circunstâncias temos uma corporação cuja conformação está sustentada em artificialidades de direito. Não se trata, portanto, de uma corporação de fato.

*Jorge Rodrigo Araújo Messias é advogado-geral da União, Alexandre Silveira é ministro de Minas e Energia

5, proposta pela Advocacia-Geral da União na Suprema Corte, em 5 de maio, contra dispositivos da lei 14.182/2021 (Lei de Desestatização da Eletrobras), desencadeou uma série de críticas por parte de vozes do mercado. Uma das mais recorrentes é que a iniciativa pretende minar o sistema de Corporation, que veda a constituição de blocos de controle definidos e impede que acionistas detenham participação com direito a voto maior que 10% do capital da companhia.

Os mesmos críticos argumentam que os investidores adquiriram parte do capital social da Eletrobras com a perspectiva de que não haveria nenhuma interferência da União na condução da empresa, fato que se refletiria nas ações adquiridas nas ofertas públicas.

Tais argumentos, em nossa avaliação, são falaciosos. Isso porque, antes de tudo, não se pode garantir que o preço pago pelos compradores das ações incluía valor adicional relativo ao controle da empresa. Diferentemente de um leilão tradicional, em que há oferta global de ações com a aquisição de controle, não há possibilidade de estabelecer uma correlação entre os preços praticados e a cessão do controle da empresa. Exatamente por isso, há quem sustente que o valor privado investido na empresa, com redução do poder de voto da União e sua consequente partilha entre minoritários, deveria suplantar a cifra de R$ 280 bilhões.

No entanto, para demonstrar que não existe relação necessária entre preço e diluição do poder de voto da União, basta lembrar que todos os investidores que detinham ações da empresa antes da desestatização foram premiados, sem nenhum investimento adicional, com maior participação política nas deliberações mediante o embargo artificialmente criado ao exercício do poder político pela União.

Todos os acionistas tinham participação inferior a 10%. Todos, então, foram favorecidos. Com a procedência da demanda judicial, a diminuição da participação da União nas deliberações da companhia, por sua vez, ficará assegurada quando houver a efetiva diluição do capital por ela detido mediante novas ofertas de ações.

Sob outra ótica, não há na ação proposta nenhuma crítica ao modelo de Corporation. Em verdade, a insurgência da União é contra a aplicação de tal modelo sem que se tenha a efetiva diluição do capital social da empresa. Não por outra razão, as analogias com outras companhias, a exemplo de B3 e Embraer, não se sustentam.

O maior acionista da B3 detém apenas 10,6% do capital. Na Embraer, 15,1%. As ações ordinárias diluídas em mercado superam 72% na B3 e beiram 80% na Embraer. Tais companhias têm real diluição do capital social, e não uma artificialidade jurídica concedida a minoritários sem o correlato pagamento pelo poder político retirado da União.

O processo de desestatização da Eletrobras está incompleto. A aplicabilidade imediata das previsões legais de corporação importa, sim, num capitalismo sem risco, em que minoritários com posições relevantes administram a empresa.

Porém, na hipótese de fracasso dos negócios, o prejuízo da União será, no mínimo, proporcional ao capital público investido na empresa. Tudo sem afastar a responsabilização por eventual descontinuidade no serviço público essencial por ela prestado.

Daí a legítima pretensão veiculada na ADI: uma interpretação da legislação mais ajustada à finalidade de real desestatização da empresa, mediante a diluição dos recursos públicos hoje nela investidos. Somente assim serão afastadas compreensões que impliquem possibilidade de dirigir a companhia sem correspondente responsabilidade por suas atividades.

Nas atuais circunstâncias temos uma corporação cuja conformação está sustentada em artificialidades de direito. Não se trata, portanto, de uma corporação de fato.

*Jorge Rodrigo Araújo Messias é advogado-geral da União, Alexandre Silveira é ministro de Minas e Energia

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